(leituras: Ez 37,12-14
Sl 130 (129)
Rom 8,8-11
Jo 11,1-45))
O evangelista João, no
episódio da morte e ressurreição de Lázaro interpela-nos. Em que queremos
acreditar? Num morto que se torna vivo, ou num morto que está vivo?
Orfeu desceu ao reino
dos mortos para trazer Eurídice, a mulher amada. Chorou para enternecer Hades e
conseguiu-o. Uma condição apenas: que não olhasse para trás, para a mulher,
enquanto não chegassem ao campo aberto ao Sol. Orfeu não resistiu e perdeu a
mulher pela segunda vez. Somos como Orfeu os que queremos ver neste episódio
relatado por João, um Lázaro a voltar à vida material.
O Mestre, como Orfeu,
chorou de saudade pelo amigo morto. Porque se chora a partida de um amigo, não
a sua chegada!
Depois diz João que Ele
mandou retirar a pedra e que o morto saiu. Como relata João, saiu morto, não
vivo. Depois o Mestre disse: Desligai-o e deixai-o ir.
João não pôs na boca do
Mestre o que ele não disse nem fez: que o deixassem ficar. Apesar de amigo não
o quis para si, como Orfeu. Os amigos, como nós, diziam-lhe com a boca o que o
coração não acreditava: que os mortos viveriam. Por isso o Mestre disse que o
deixassem ir, não que o deixassem ficar.
É preciso deixar que os
mortos partam para que possam viver.
E então o milagre?
Acaso pretendo cair em apostasia, blasfémia ou heresia?
Uns dizem que Lázaro
não chegou a morrer. Jesus, grande curandeiro, tirou-o da letargia. Outros, a
tese mais “oficial”, que não, estava morto e ficou vivo. Vivo biologicamente.
Grande milagre de facto, mas e a esperança?
A esperança não pode
residir num morto que se torna vivo (seria o triunfo da carne e da morte), mas
num morto que está vivo, gritando que a morte não existe. Tirai a pedra dos
vossos corações, desligai as faixas, para que o espírito permaneça vivo por
causa da justiça, como dizem as leituras.
O milagre não o nego.
Todos os que estavam presentes naquele dia puderam ver um morto sair de um
buraco escuro e fundo, desligar-se e partir em direcção da Luz.
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