É voz comum,
disparatada mas comum, que a Igreja, através da inquisição, condenou Galileu
por heresia mantendo assim um combate constante contra a ciência. Quem assim
pensa não faz a mínima ideia do papel da Igreja no ensino da Ciência e do facto
de Galileu nunca ter sido considerado herético (não tendo sido torturado e
muito menos condenado à morte). Galileu defendeu uma teoria que já existia mas
que só era permitida como hipótese para os astrónomos fazerem os seus cálculos,
e que ia contra o sistema aristotélico defendido pelos sábios universitários.
Ora a Igreja era quem mandava nas universidades e as invejas dos sábios
universitários foram mais fortes que a amizade do Papa Urbano VIII pelo famoso
matemático e astrónomo. Galileu era arrogante e desbocado, chegando a dizer
algumas tolices como a de que a prova que a Terra se movia era o facto de haver
marés, chamando idiotas aos que defendiam o efeito da Lua. Mas Galileu era um
grande cientista e tinha razão, apesar do disparate das marés. Não obstante
perdeu a carreira e foi mesmo condenado à prisão, que se transformou em
domiciliária, sem pulseira, por pressão dos seus amigos, o arcebispo de Siena e
o Grão Duque da Toscana, na sua residência da Vila do Gioiello, em Florença.
Com o caso de Galileu
encerrado, a inquisição extinta, e as universidades tornadas laicas, julgámos
nós, gente do senso comum, que a liberdade de expressão permitiria a qualquer
cientista dizer os disparates e as idiotices que quisesse, desde que isso não
pusesse em causa o seu raciocínio científico. Não é assim. Vivemos sob o
escrutínio do politicamente correcto, e tal como na Renascença, em que não era
permitido contradizer Aristóteles ou os Padres da Igreja, não podemos emitir
opinião contrária à defesa das chamadas causas fracturantes, mesmo que isso não
interfira com o nosso juízo científico. Somos todos Charlie, mas estamos longe de sermos Tim.
Sir Tim Hunt, cientista com Nobel a
atestar a sua qualidade, teve de abandonar a sua carreira por confessar
publicamente que se apaixonava pelas cientistas com quem trabalhava e afirmar
que o choro é também uma característica feminina, demonstrando à saciedade não
perceber nada de mulheres. Foi condenado, não por ser mau cientista, mas por
ser um idiota pinga amor. Ao contrário de Galileu, não teve direito, sequer, a
julgamento.
Voltando a Galileu,
tenho a certeza que o famoso astrónomo seria de novo condenado pelos modernos
familiares do Santo Ofício que zelam pela correcção da linguagem e do
pensamento. É que afirmar que a Terra gira em volta do Sol, é um axioma
absolutamente machista e contrário ao compromisso que a Universidade tem com a
igualdade de género. Em vez do sussurro: E
pur si muove, ouviríamos, e pur si
muovono insieme…
Sabem o que vos digo?
Vou até ali à esplanada, beber umas bejecas e apreciar o movimento das pernas
da outra metade da humanidade, imaginando-me um Sol heliocêntricamente instalado.
A frase é redundante, eu sei, mas que se dane.
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