quarta-feira, 17 de junho de 2015

A NOVA INQUISIÇÃO


É voz comum, disparatada mas comum, que a Igreja, através da inquisição, condenou Galileu por heresia mantendo assim um combate constante contra a ciência. Quem assim pensa não faz a mínima ideia do papel da Igreja no ensino da Ciência e do facto de Galileu nunca ter sido considerado herético (não tendo sido torturado e muito menos condenado à morte). Galileu defendeu uma teoria que já existia mas que só era permitida como hipótese para os astrónomos fazerem os seus cálculos, e que ia contra o sistema aristotélico defendido pelos sábios universitários. Ora a Igreja era quem mandava nas universidades e as invejas dos sábios universitários foram mais fortes que a amizade do Papa Urbano VIII pelo famoso matemático e astrónomo. Galileu era arrogante e desbocado, chegando a dizer algumas tolices como a de que a prova que a Terra se movia era o facto de haver marés, chamando idiotas aos que defendiam o efeito da Lua. Mas Galileu era um grande cientista e tinha razão, apesar do disparate das marés. Não obstante perdeu a carreira e foi mesmo condenado à prisão, que se transformou em domiciliária, sem pulseira, por pressão dos seus amigos, o arcebispo de Siena e o Grão Duque da Toscana, na sua residência da Vila do Gioiello, em Florença.
Com o caso de Galileu encerrado, a inquisição extinta, e as universidades tornadas laicas, julgámos nós, gente do senso comum, que a liberdade de expressão permitiria a qualquer cientista dizer os disparates e as idiotices que quisesse, desde que isso não pusesse em causa o seu raciocínio científico. Não é assim. Vivemos sob o escrutínio do politicamente correcto, e tal como na Renascença, em que não era permitido contradizer Aristóteles ou os Padres da Igreja, não podemos emitir opinião contrária à defesa das chamadas causas fracturantes, mesmo que isso não interfira com o nosso juízo científico. Somos todos Charlie, mas estamos longe de sermos Tim.
Sir Tim Hunt, cientista com Nobel a atestar a sua qualidade, teve de abandonar a sua carreira por confessar publicamente que se apaixonava pelas cientistas com quem trabalhava e afirmar que o choro é também uma característica feminina, demonstrando à saciedade não perceber nada de mulheres. Foi condenado, não por ser mau cientista, mas por ser um idiota pinga amor. Ao contrário de Galileu, não teve direito, sequer, a julgamento.
Voltando a Galileu, tenho a certeza que o famoso astrónomo seria de novo condenado pelos modernos familiares do Santo Ofício que zelam pela correcção da linguagem e do pensamento. É que afirmar que a Terra gira em volta do Sol, é um axioma absolutamente machista e contrário ao compromisso que a Universidade tem com a igualdade de género. Em vez do sussurro: E pur si muove, ouviríamos, e pur si muovono insieme
Sabem o que vos digo? Vou até ali à esplanada, beber umas bejecas e apreciar o movimento das pernas da outra metade da humanidade, imaginando-me um Sol heliocêntricamente instalado. A frase é redundante, eu sei, mas que se dane.

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