Há dois tipos de
substâncias que podem ser mortais e que connosco convivem: os venenos e os
germes. Aos venenos basta que não lhes toquemos e eles nada farão contra nós.
Quanto aos germes, a prevenção é mais difícil. Luaty Beirão e seus companheiros
são para o governo de Angola, com perdão da comparação, como os venenos: não
lhes tocasse o governo angolano e ninguém daria por eles, tão perigosos como
beladonas num campo primaveril. Mas o governo Angolano, revelando pouco
traquejo político, tocou-lhes e tomou deles o veneno. Os efeitos da toxicidade
logo se verão.
Não sabemos ainda quais
serão os efeitos desta atitude tóxica no governo de Angola mas já se conhecem
efeitos, por contágio, nos deputados e políticos portugueses, com excepção do
BE que tomou a tempo o antídoto (lá diz o povo, mordedura de cão trata-se com
pêlo de cão). Jorge Coelho, por exemplo, vê um neocolonialista em cada crítico
de Angola, enquanto o PCP já não consegue distinguir a esquerda da direita,
porque os revolucionários que antes apoiavam se ligaram ao grande capital sem
que o partido dos trabalhadores se tenha dado conta. O PS titubeia devido aos
efeitos paralisantes do tóxico, dizendo que sim e que não, mas talvez. O PSD e
o CDS, esquecendo-se das suas corajosas tomadas de posição sobre assuntos
internos da Coreia do Norte, aliaram-se ao PCP, dando a mão direita a quem não
sabe da esquerda.
Fatal e perigoso é, no
entanto, o estado em que ficou o deputado Duarte Marques. Tendo levantado a voz
contra o BE por este demorar em insurgir-se contra o governo de Angola, votou
contra, quando, finalmente, o Bloco desancou naquele governo. Agoniado, não se
lembrou de outra coisa e vai de botar nas redes sociais a preclara declaração
de voto que fez ecoar no vetusto convento de S. Bento, com uma retórica digna
do Dr. Libório de Meireles, criação do meu querido Camilo, mas sem o estilo
farfalhudo, que o deputado de RibaTejo não sabe latim nem grego, o que faria
Calisto Elói, adversário do Libório, entristecer-se ainda mais ao “contemplar a ribaldaria com que os
belfurinheiros de missangas e lentejoulas adornam a língua de Camões”.
Disse o nosso deputado que a prisão dos activistas angolanos é uma violação dos
direitos humanos que fere os valores fundadores da CPLP. Depois acrescentou que
votou contra as propostas do BE e do PS porque entende que não devem os
parlamentos imiscuir-se na justiça dos outros a não ser que estejam em causa,
aqueles mesmos direitos humanos!?
Percebeu o leitor o
quão grave é o estado do nosso deputado? Esperemos agora o evoluir da doença,
que a mim veio-me de novo à lembrança o Calisto Elói do Camilo: “Retórica, gramática e lógica, se alguém
quiser tratá-las neste prédio, entretenha-se lá em baixo no pátio com o
porteiro, ou com as viúvas e órfãos, que pedem pão com a lógica da desgraça, e
com a retórica das lágrimas; gramática não sei eu se a fome a respeita:
parece-me que não, porque na representação nacional há famintos que a não
exercitam primorosamente.”
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