Porque é verão,
tempo de frivolidades, decidi deixar aqui uma receita para uma entrada simples
e despretensiosa, possível até no campismo. Inventei-a no dia de anos do meu
filho, quando a primavera se rendia ao verão, entre o santo António e o são
João. Por isso chamei-lhe “tostas de santo António”: Santo António porque, tal
como o santo, junta a Itália com Portugal, que é sempre um bom casamento, desde
que o nosso primeiro Afonso mandou vir daquela península, a primeira rainha de
Portugal.
Cortem-se fatias de
um bom pão de trigo, daquele que celebra o Mediterrâneo por onde o nosso
santinho navegou. É certo que o pão nasceu entre o Tigre e o Eufrates,
mananciais do golfo pérsico e do Índico, mas era uma coisa dura e sem graça. A
bola de trigo levedada, fofa e gostosa desenvolveu-se entre a foz do Nilo e os
Pirinéus, acabando os celtas por abrir padarias pela Europa fora. Fomos nós, os
ibéricos, quem o fazia mais fofo pela levedura roubada à espuma fermentada da
cerveja. Outros copiaram-nos e usavam o mosto das uvas para o efeito. Esteve o
pão sempre ligado à bebida fermentada de tal modo que Nosso Senhor assim quis
ficar entre nós: no pão e no vinho, que fermento era ele.
Se as fatias forem
muito grandes corte-as ao meio de modo a que tenham, mais coisa menos coisa,
meio palmo, ou sejam 10 a 12 cm de lado. Botem as ditas no forno a torrar de um
lado e do outro, só a alourar como a senhora Merkel. Podem comprar tostas já
feitas, mas não aconselho. Só autorizo se estiverem acampados e houver urgência
em impressionar.
Em estando as
tostas frias, coloque em cima de cada uma, duas rodelas de tomate seco em
conserva de azeite, e cá temos a Itália: tal como nacionalizámos o bacalhau do
mar do Norte, fizeram os italianos o mesmo ao tomate americano. Deixe que o
tomate pingue o azeite da conserva sobre a tosta para aligeirar a dureza e a
secura do pão.
Cubram-se as
rodelas de tomate com folhas frescas de manjericão, que há-de dar um sabor
fresco ao verão, a lembrar manjericos. Entretanto vá servindo um branco fresquinho à
namorada/o que convidou para jantar, e cante-lhe uma quadra bem rimada que fale
dos olhos dela ou dele, a não ser que seja vesga/o, situação em que deve evitar
qualquer menção aos ditos:
Sardinhas de sant’ António
Fugiram do teu
olhar,
Mora nele um
demónio
Que obriga a te
amar!
Sardinhas, lembra a
quadra, e temos Portugal. A sardinha, como é sabido, é bem portuguesa embora
navegue pelos sete mares, ou não tivessem sido os portugueses quem os abriu ao
mundo. Vem agora a propósito contar a história do célebre sermão do doutor da
igreja nascido à sombra da Sé:
Andavam as
sardinhas em cruzeiro pelo Adriático quando ouviram falar que o santo gostava de
ensinar, em sermões cheios de saber, a bicheza do mar, e puseram-se à escuta.
Diz quem lá esteve que quando o santo pregou aos peixes, foram as sardinhas as
mais atentas, e que estas, por diversas vezes, tiveram de pôr na ordem o
carapau que atrevido, as tentava distrair. Por isso comem os portugueses tanta
sardinha, na esperança de adquirirem o saber que o santo lhes legou, mas em
vão, porque não passam de “carapaus de corrida”.
Abram-se portanto latas
de sardinhas em conserva de azeite, picante ou não, mas nunca em molho de
tomate, porque isto dos tomates convém tê-los mas com conta, peso e medida,
para não espantar o gado, salvo seja.
Para que não fique
a tosta muito alta, que são as portuguesas baixinhas, costumo cortar
longitudinalmente as sardinhas e aproveito para lhes tirar a espinha que elas
têm, ao contrário de certos políticos. E assim, maleáveis e rendidas, sem
espinha que as endireite, vergo-as com gentileza sobre a cama verde do
manjericão.
E pronto, agora é
só comer… as tostas, que ainda não é hora da sobremesa!
Pão de trigo às fatias, alouradas no
forno
Rodelas de tomate seco em conserva
de azeite (compra-se em qualquer supermercado de jeito)
Folhas de manjericão fresco
Sardinhas em conserva de azeite
Alguém a quem se ame (ou se deseje,
na impossibilidade de amar)
Um vinho para acompanhar
Uma quadra popular (à falta de
melhor, podem utilizar a que aqui fica)
Quero avisar os leitores deste blog que esta receita é fácil e boa, obrigada
ResponderEliminar