Aqui há tempos, alguém pouco frequentador das salas de
concerto nacionais, confessava-se admirado de ter ouvido uma orquestra
portuguesa bem afinada. É assim ainda com muita gente. Não sabem, por exemplo,
que Maria Callas entrou no palco do São Carlos de braço dado com Álvaro Malta,
um obstetra que cantava ópera quase como amador, no melhor sentido da palavra,
ou que no último ciclo do “Anel do Nibelungo” de Wagner foi um alcobacense,
Jorge Trindade, quem nos deliciou com um comovente solo de clarinete naquele
mesmo teatro.
E é assim porque se continua a pensar
que só lá fora se faz bem, como se eu não tivesse ouvido uma orquestra alemã
desafinar numa famosa sala de Londres, ou se não tivesse sido um alemão quem
proporcionou uma das temporadas mais desastrosas do nosso teatro lírico.
Dir-me-ão que são as excepções que
confirmam a regra. Talvez. De facto Portugal teve ao longo dos últimos anos e
séculos, grandes nomes no meio musical, mas faltava-lhe consistência e regularidade.
Isto é, eram excepções num meio onde faltavam orquestras, agrupamentos, escolas
e cultura musical.
Era assim há 25 anos. Hoje é
possível, no Oeste, e só com a prata da casa, percorrer o universo musical do
jazz ao clássico com a qualidade “do que se faz lá fora”, e não estou a falar
de excepções, mas de uma massa crítica de gente jovem que tem a técnica, o
saber e a cultura musical necessárias, para transformarem a música numa
actividade cultural de prestígio que a todos nos honra.
Essa massa crítica não nasceu de
geração espontânea. Foi o esforço de alguns “doidos” que apostaram na educação
e na formação. Da união de esforços de um “doido” do Oeste e de uma visionária
que veio de França, se percorreu a distância que vai de uma loja de música a um
conservatório de música. Depois foram outros projectos e tudo deu flor e fruto;
agora são maestros, compositores, bandas de grande qualidade nas Caldas da
Rainha, Valado, Famalicão e Nazaré, grupos de música ligeira, de jazz e de
Câmara, festivais de música, etc. Para não me acusarem de ser excessivamente
positivo, direi que só falta a ópera (resolvam os responsáveis pela educação o
problema do ensino de cordas que o canto, cenários, guarda-roupa, faz-se cá que
temos massa crítica e escolas para isso). O resto está cá tudo, com tanta
qualidade como do melhor se faz por esse mundo fora.
Foi no São Martinho, época de
apreciar as colheitas: Ontem, a Big-Band da Nazaré, com a rapaziada do Oeste,
deu-nos momentos de felicidade e gozo, como quem frui de um néctar proveniente
da vindima de uma vinha de boa qualidade, bem plantada, e cuidada.
Já que falamos da Nazaré, convém
esclarecer que o jazz não é propriamente a minha praia, mas ontem, no Centro Cultural
e Congressos de Caldas da Rainha, a Big-Band da Nazaré e seus convidados
conseguiram comover-me e pôr-me com a lágrima ao canto do olho ao ouvir tão
bela e preciosa colheita destes vinte e tal anos. Valeu a pena.
As cantoras e os solistas foram
magníficos, mas seria arrogância pôr-me agora a fazer crítica musical. Não
posso, contudo, deixar de sublinhar o excelente tema de João Capinha: A
qualidade da composição, aliada à qualidade da execução, proporcionou-nos um
momento de grande beleza.
E ouviram-se duas vozes magníficas:
Joana Rios e Júlia Valentim. A “nossa” Júlia conheci-a quanto integrámos um
coro para o Requiem de Mozart. A
Júlia, que canta Schubert com a graça de um anjo, cantou jazz com a
sensualidade e o calor dos planaltos de Angola. Esteve grande, enorme, naquele
palco.
É caso para dizer que o canhão da
Nazaré provocou uma onda gigantesca que varreu o Oeste. Obrigado Adelino Mota.
Muito obrigado amigo João!
ResponderEliminarGrande prazer ler as tuas palavras...
Breve vamos trabalhar juntos, depois de muitos anos, espero que nos venhamos a divertir tanto como ontem, o palco é o mesmo, lá nos encontraremos!
Grande Abraço
Obrigado eu, Mota. Um grande abraço e bem haja a tua loucura.
EliminarObrigada João, palavras quentes e luminosas no meio de tanta escuridão!!
EliminarEstão todos de parabens estou a ouvir agora a Big Band Nazare, é realmente bonito, força para o Oeste
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