A comunidade Europeia
acaba de ganhar o prémio Nobel da paz. A alguns causou estranheza, a outros
alegria, a muitos indiferença e ainda repulsa, dada a fraca companhia a que tal
prémio anda associado. No meio desta crise e quando a ameaça da fome paira
sobre alguns europeus é fácil esquecer as desgraças e misérias de uma Europa a
que nos habituámos a olhar como o eldorado. É fácil esquecer que há 20 anos,
nos Balcãs, os vizinhos matavam-se uns aos outros e há 25 anos, em Berlim, quem
saltasse muros era morto. Se o prémio servir para abrir as nossas consciências
para a construção dessa paz europeia, só possível com a erradicação de egoísmos
(e nacionalismos exacerbados são também egoísmo), será bem vindo.
Soube deste prémio quando visitava
os marcos miliários que os romanos deixaram há quase dois mil anos nas estradas
que construíram no mais recôndito das nossas serras. Daqueles vales e montes,
onde há bem pouco só a pé ou sobre bestas se ia, chegava-se a Roma por estrada
calcetada, capital desse projecto europeu construído pela força mas também com
generosidade. A estrada vinha pacificar, civilizar mas também levar os recursos
mineiros de que dispúnhamos. Pacificavam-se as tribos locais e os belicosos
lusitanos que, ao contrário do que nos ensinaram, não estavam “postos em sossego”
quando atormentados pelo gládio dos romanos, mas mordendo-lhes as canelas no
vale do Pó enquanto acompanhavam os elefantes de Aníbal. Não seria a última vez
que os “lusitanos” levariam elefantes a Roma, mas isso é outra história.
Perdemos a soberania, gritaram eles
e gritamos nós atormentados por uma dívida que não conseguimos pagar. Mas não foi
com a exigência do pagamento da dívida que perdemos a soberania: foi quando usámos
o dinheiro em bancos de jardim e rotundas. Quando se pede emprestado para
comprar uma casa, pedimos o direito à mais elementar dignidade, mas quando
pedimos para os cortinados perdemo-la, principalmente quando quem empresta não
faz uso de cortinados por supérfluos. Por esta perda de soberania, há agora
quem ache que é traição continuarmos europeus.
Afonso
Henriques conquistou Lisboa com a ajuda de alemães e ingleses e construiu
Alcobaça para a ordem de São Bento, outro importante projecto europeu cujo mote
foi “ora et lavora”, o espírito e a matéria num só. Depois casou a filha com a
Flandres que começava a cantar as lendas arturianas e a demanda do Graal. Em
São Mamede venceu a mãe e um projecto nacionalista (que alguns sonham
ressuscitar). Agradou aos barões locais e a Braga, mas no seu íntimo mais secreto
escondia a vontade de continuar, em direcção ao mundo, aquela geira romana que
terminava no Minho, transformando Portugal na vanguarda de um projecto europeu.
O rosto da Europa é Portugal, diz Pessoa. Não pode ser traição!
O legado europeu, da cultura aos
direitos do homem, morre com a Europa, face à emergência brutal de interesses
meramente económicos que até em insuspeitados regimes comunistas floresce.
Portugal tem responsabilidades históricas na transmissão desse legado. Será
traição deixar morrer esta demanda do graal: da sabedoria que trará a
abundância.
A europa nem um penico de barro merece, quanto mais um premio da paz.
ResponderEliminarO que a velha europa precisa ee de fabricar mais loiça e vende-la aos orientais. Assim pode ser que um dia se equilibre na balança do poder.
O que a velha Europa precisa é de acreditar no seu legado humanista para poder transmiti-lo aos outros. Não poder.
ResponderEliminar